Nesta série de textos, cada capítulo proporciona uma viagem por cada um dos oito temas da Campanha tODxS pela Educação para o Desenvolvimento e a Cidadania Global, começando pelo mundo e acabando na Guiné-Bissau, começando com um ponto de situação global e acabando com o trabalho, atual e imediato, de tantos no progresso e desenvolvimento desse país.

Ao nível mais básico, a saúde de uma determinada comunidade é função do ambiente epidemiológico, da qualidade do saneamento e da regularidade dos hábitos de higiene. A promoção da saúde pública pode ser realizada através de dois tipos de estratégia: prevenção de doenças e enfermidades, dado o contexto de epidemiologia, saneamento e higiene, e mitigação de doenças e outras fontes de mal-estar.
A prevenção passa principalmente pela proteção de comunidades contra ameaças locais, como vetores de malária, dengue e outras doenças infeciosas, através de vacinas e distribuição de redes mosquiteiras. A prevenção exige, também, investimentos em saneamento e esgotos de qualidade, e na reforma de hábitos de higiene através de campanhas de sensibilização.
Em contrapartida, a mitigação consiste principalmente na instituição de um sistema de saúde adaptado ao padrão específico de doenças e enfermidades de um país. Isto requer a formação e o emprego de profissionais de saúde, a aquisição de tecnologia médica e de medicamentos, a construção de hospitais e de centros de saúde e, finalmente, o desenvolvimento de um sistema de informação para monitorizar indicadores de saúde e o sucesso de diferentes programas de tratamento de enfermidades.
As mortes evitáveis são causadas por carências e falhas nos esforços de prevenção e mitigação, devendo-se mesmo, às vezes, a uma combinação de falhas em ambos. As fatalidades por malária são, por exemplo, associadas primariamente a deficiências de esforços de prevenção, enquanto a mortalidade materno-infantil a problemas de mitigação, mas são ambos devidos a falhas nas estratégias das duas. Isso indica que a promoção da saúde pública exige, em qualquer momento, um equilíbrio complexo entre o investimento em prevenção e mitigação.
Existe, no entanto, uma clara relação estatística entre a quantidade de investimento na saúde pública, independentemente da sua distribuição entre prevenção e mitigação, e a esperança de vida num dado país. O investimento na saúde pública tem tido, porém, menos impacto na Guiné-Bissau, por cada dólar investido, do que em países com níveis comparáveis de investimento. Na Tabela 1, em baixo, nota-se que vários países, como o Senegal e o Paquistão, gastam menos per capita na saúde, mas apresentam taxas de mortalidade infantil mais baixas do que a Guiné-Bissau, para citar um indicador importante da eficácia de sistemas de saúde. A quarta coluna da tabela apresenta uma medida da eficiência da despesa de saúde na redução da mortalidade infantil em cada país, com valores maiores indicando maior eficiência, e menores menos.

O que a quarta coluna indica é que, comparada com países com níveis de despesa semelhantes, a distribuição atual do investimento guineense na saúde não está bem-adaptada para erradicar, com celeridade e eficiência, as causas de mortalidade infantil relacionadas ao ambiente epidemiológico, qualidade de saneamento, hábitos de higiene e outros fatores determinantes de saúde pública.
Esta ineficiência também se regista na baixa tradução de aumentos de despesa na saúde em aumento de esperança de vida entre 2000 e 2022, documentada na Tabela 2, em baixo. É conhecido que, após um certo patamar, o aumento de cada ano adicional de esperança de vida custa mais dinheiro. A comparação da eficiência do investimento na saúde da Guiné-Bissau deve ser feita, por isso, com países diferentes dos da anterior tabela e, em vez, com expetativas de vida semelhantes em 2000, na faixa entre 49 e 51 anos. Mesmo utilizando este grupo de países equiparáveis, do ponto de vista de esperança de vida, a Guiné-Bissau destaca-se pelo pouco impacto que o aumento na despesa da saúde teve ao longo do período de 2000 até 2022 noutro indicador de interesse, a esperança de vida.

Embora a Guiné-Bissau tenha tido em 2022 uma das maiores despesas de saúde deste grupo de países, só atrás da Libéria e da Costa de Marfim, o aumento dessa despesa não se traduziu num aumento de esperança de vida tanto como em outros países comparáveis, como mostra a medida na quinta coluna, onde valores maiores indicam menor impacto de cada aumento de despesa, e menores valores maior impacto. Nessa medida, entre países com aproximadamente a mesma esperança de vida em 2000, só a Libéria e o Burkina Faso são mais ineficientes na despesa na saúde.
Tipicamente, em países em desenvolvimento, as despesas dos cuidados de saúde são pagas do próprio bolso, fazendo com que o acesso a cuidados de saúde seja basicamente determinado pelo nível de rendimento de cada pessoa ou família. Para além do fraco impacto que os aumentos na despesa na saúde têm tido na esperança de vida ou na redução de mortalidade infantil na Guiné-Bissau, o próprio sistema de saúde estruturalmente exclui os que são mais vulneráveis ao ambiente epidemiológico, escassez de saneamento e falta de higiene.
O Projeto PIMI, implementado pelo IMVF com o apoio da União Europeia e o Instituto Camões, procura reduzir essa falta de acessibilidade, particularmente nas áreas de saúde materna e infantil. Como lembra Anderson Bitipta, antigo Diretor do Hospital de Bafatá, no vídeo em baixo, é uma prioridade conceber e implementar meios de financiamento que se estendam para além da conclusão do projeto, de forma a continuar a assegurar a acessibilidade de cuidados sanitários aos mais vulneráveis.
Entrevista Anderson Bitipa – Dificuldades de acesso à saúde em Bissau
Indo além da eficiência do investimento, a Tabela 3, em baixo, demonstra a incidência de várias doenças na Guiné-Bissau.

Esta situação de infeção e incidência de doenças soma-se a um quadro grave de saneamento no país. De acordo com dados da OMS e da UNICEF, só 23,3% da população da Guiné-Bissau utiliza serviços de água potável geridos seguramente. Por cada 100.000 guineenses, 35.8 morrem por causa de saneamento inseguro. Para além da redução destas fatalidades, melhorando acesso a serviços de água potável e a saneamento seguro pode melhorar a qualidade da saúde de milhares de guineenses. Em termos de vacinação, entre 70 a 80% de guineenses estão vacinados para doenças como difteria, tétano, coqueluche e hepatite B, entre outras.
O que tais dados indicam é a tamanha dificuldade de definir a alocação de investimento dado a complexidade dos fatores, ambientais, sociais e higiénicos, de saúde pública. É amplamente claro, porém, que o acesso a água segura, entre outras prioridades sanitárias, terá impactos em diversas dimensões de bem-estar dos guineenses, não só na saúde: o acesso a água potável poderá, por exemplo, diminuir o tempo gasto, principalmente por mulheres, na coleção e transporte de água para o meio doméstico, conduzindo a uma distribuição mais equitativa de tarefas domésticas e facilitando a entrada de mulheres no mercado de trabalho formal.
Para saber mais sobre estes temas, ouça Anderson Bitipta a falar sobre a economia de saúde da Guiné-Bissau.
Entrevista Anderson Bitipa – Guiné-Bissau em 2030
Entrevista Anderson Bitipa – Falta de profissionais no hospital de Bafatá
Entrevista Anderson Bitipa – Falta de Recursos Humanos nos Hospitais da Guiné-Bissau
Para saberes mais sobre este tema consulte a nossa ficha de ação pedagógica aqui.
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